Esse post foi publicado 02 de maio de 2017 às 12:54 e está arquivado em Textos. Você pode acompanhar quaisquer respostas a esta entrada através do RSS 2.0 feed. Você pode deixar uma resposta, ou trackback de seu próprio site.
Um dia sabático
Arnaldo Mourthé
Muitos profissionais deixam sua atividade por um tempo, para reflexão. Querem saber se aquilo que fazem é o melhor para eles. Alguns voltam ao seu trabalho rotineiro, outros mudam completamente de vida. Muitas universidades dos países mais ricos concedem a seus professores um período de férias remuneradas para reflexão. São os períodos sabáticos, que podem ser até de um ano. E não se arrependem disso. Afinal elas querem estar seguras que seus professores estejam adaptados às funções que exercem. Há, portanto, um reconhecimento por parte das elites intelectuais da necessidade da reflexão. Caso contrário elas perdem sua condição, sua razão de ser.
Essa forma de entendimento não existe em muitas pessoas que aparentemente são instruídas e que, até mesmo, ocupam funções importantes dentro da sociedade. Isso eu constatei em algumas manifestações nas redes sociais. Pessoas ilustradas e consideradas por sua condição social e de instrução, atacando as manifestações dos trabalhadores do último dia 28, com um argumento curioso, aparentemente correto: “Eles podem até ter razão, mas não têm o direito de impedir que as pessoas cheguem ao trabalho bloqueando os meios de transporte.” Será isso verdade?
Algumas coisas eu aprendi na minha experiência de 80 anos, 45 deles trabalhando na minha atividade profissional, inclusive no exterior. Durante cinquenta anos militei na política, aos quais incluo meus quase dez anos de exílio e minha prisão com tortura nos porões da ditadura. Uma dessas coisas é o direito à liberdade de todo ser humano, assim como o do povo de rebelar-se contra a opressão. Independentemente de minhas experiências, está escrito na Declaração de Independência dos EUA, de 4 de julho de 1776, o seguinte:
“Nós temos por evidências por elas mesmas as verdades seguintes: todos os homens são iguais; eles são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis; entre esses direitos se encontra a vida, a liberdade e a procura da felicidade. Os governos são estabelecidos entre os homens para garantir esses direitos, e seu justo poder provém do consentimento dos governados. Todas as vezes que uma forma de governo ameace esse objetivo, o povo tem o direito de mudá-lo ou de aboli-lo, e estabelecer um novo governo, fundado sobre os princípios e organizado na forma que lhe parecerão os mais adequados para lhe oferecer a segurança e a felicidade”.
Alguns de nossos cidadãos ainda não assimilaram esses conceitos, que são pilares da nossa civilização, consagrados há 240 anos. É de se preocupar, porque nosso governo atual está aí para destruir grande parte das conquistas do povo brasileiro em mais de 500 anos de trabalho e sacrifício. Eles manifestam sua intolerância para com um protesto de um só dia, feito em paz, apenas perturbado pela polícia assassina do Rio de Janeiro, em uma administração falida, herança da mais escabrosa história de corrupção de um governador de Estado.
Essas pessoas, no seu “conforto’ de alienados, usufruindo de alguns pequenos privilégios, atacam os desesperados, ou quase, que lutam apenas para manter direitos já conquistados a duras penas, depois de massacrados por uma elite canalha por mais de quatro séculos, período que se encerrou com a Revolução de 30 que veio dar guarida aos legítimos donos desse país, os trabalhadores que o construíram. A mesma elite, agora se intitulando moderna, quer restabelecer o período de escravidão, aliada à maior desgraça produzida pela humanidade, o voraz capital financeiro internacional. Essas pessoas deveriam tirar seu período sabático, para uma profunda reflexão, antes que sejam deixados à margem da história, lamentando passar pelos mesmos problemas que nossos trabalhadores passam hoje.
O pior de tudo é que eles retardam a retomada de um processo de libertação do nosso país, o que vai custar muito caro a todos, sobretudo a eles mesmos, que certamente perderão muitos dos privilégios que desfrutam hoje, restando-lhes a lamentação.
Rio de Janeiro, 30/4/2017.
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