Pensar o futuro é preciso
Arnaldo Mourthé
Se não soubermos para onde ir, não chegaremos a lugar algum.
É preciso ter em mente que chegou a hora de pensarmos nosso futuro. E é urgente. Estamos vivendo há três anos em um país dividido, quase ao meio. Cada lado pensando ser o certo enquanto o outro é o errado. Mas a realidade dos fatos mostra que os dois lados estavam errados. Todos ou quase todos estavam iludidos. E muitos ainda estão. Pensar que algum nome do passado, quem quer que seja, vai resolver nossos problemas é um ledo engano. Todos estão comprometidos com as mazelas que aí estão, alguns mais ou outros menos. Há ainda aqueles que fecharam os olhos à grande conspiração em marcha contra nosso país e nosso povo, e agora se surpreendem com o que deixaram acontecer.
Não se vê no Congresso ou na imprensa nenhuma saída consistente para o caos. Fala-se em reformas políticas ou sociais. A grande publicidade é para viabilizar as reformas das leis trabalhistas e previdenciária. Mas não foram os trabalhadores que criaram a crise. Eles são suas principais vítimas. Não será penalizando-os que a resolveremos. Pelo contrário. Ela será aprofundada, quando olhada com um enfoque humano, da defesa da dignidade da pessoa ou da cidadania, fonte de todo o poder que deveria ser exercido a favor do cidadão, do povo. Quem produziu essa crise é aquele que produziu todas as crises da história desde o século XIX, a burguesia capitalista.
Suas soluções para as crises que ela criou foram todas desastrosas: as guerras. Desde as primeiras coloniais, passando pelas napoleõnicas, voltando às coloniais para a conquista da África, dividida entre as nações europeias na Conferência de Berlim de 1884/1885, presidida por Bismark. Depois foram as duas grandes guerras mundiais, com perto de cem milhões de mortos e centenas de milhões de feridos e refugiados. Recentemente as guerras para o domínio do petróleo e do gás, no Norte da África e no Oriente Médio, a chamada “primavera árabe”. A crise que vivemos é de um lado uma crise mundial do capitalismo e de outro uma crise financeira criada pelo sistema financeiro internacional, que endividou o Brasil para submetê-lo a seus interesses mesquinhos.
Nós brasileiros não produzimos nenhuma crise. Apenas trabalhamos para criar nossas famílias e desenvolver nossa Pátria. Nosso desemprego, ontem como hoje, é porque fomos arrancados de nossas terras com a promessa do progresso. Essa promessa gerou as favelas, o subemprego, o desemprego, as penúrias do dia a dia, senão o desespero de não poder alimentar, abrigar e cuidar da educação e da saúde de nossas famílias.
Tudo isso foi conduzido de forma cruel e discriminatória por elites insensíveis e impatrióticas submetidas à cultura e a avareza estrangeira. Desde a primeira cana plantada para produzir açúcar para exportação, nas capitanias de São Vicente e Pernambuco. A espoliação sistêmica não impediu que os nativos e os imigrantes que aqui chegaram construíssem a grande Nação que somos hoje.
Mas a crise atual está sendo usada para desmontar essa Nação e a Sociedade que a criou, para transformá-la em novo tipo de colônia, trabalhando para um projeto macabro de dominação do mundo pelo capital financeiro, destruindo o sistema republicano e os direitos inerentes a ele: a liberdade, a igualdade e a fraternidade.
Esse processo, hoje, tem como locomotiva um governo destituído de qualquer qualidade positiva, mas cheio de perversidade e alimentado por mentiras de uma mídia submetida à ditadura da propaganda – comercialmente desnecessário – das grandes empresas, mas que alimenta financeiramente o monstro midiático que aliena a população brasileira deixando-a vulnerável e incapaz de defender a si e a nossa Nação. Mas não estão conseguindo. O governo se desfez na sua própria insuficiência. Aquele que colocaram na Presidência é um inapto para o cargo, independentemente de suas fraquezas. O objetivo dos que dirigem o processo na obscuridade são as reformas sociais para destruir a sociedade brasileira e, com ela, a Nação. Mas o empossado não quer deixar seu lugar, mesmo sendo um impostor, talvez por isso mesmo.
Os que lá o colocaram, agora querem tirá-lo. Se há dúvida sobre isso, basta prestar atenção ao novo enfoque da mídia que o detona todos os dias (embora ele o mereça). Precisam detoná-lo, pois sua presença aumenta a força dos movimentos sociais, que são contra as reformas. Os mentores do novo governo querem que se cumpra o acordo: fazê-las. As elites aliadas do capital financeiro não têm qualquer compromisso com Temer, mas ele tem com elas. Ele está lá para defender os interesses delas, mas não tem força para tanto. Está desmoralizado. Querem outra solução que viabilize as reformas, seu objetivo imediato. Ainda não está claro qual será. Mas qualquer descuido da oposição será nefasto para o País.
Enquanto isso, os brasileiros ficam discutindo qual é o melhor candidato, ou o “menos ruim” deles, para uma eleição imediata pouco provável, pois fere dispositivo constitucional, ou para 2018, quando nem temos ideia de como chegaremos lá. É preciso antes de tudo sabermos para onde queremos ir ou, do contrário, poderemos seguir para a senzala ou para o cadafalso. Pois são esses os destinos que nossos algozes projetam para nós. Se continuarmos a acreditar nas nossas fantasias, não nos esqueçamos de escolher uma dessas alternativas, a nós reservadas, sem revelá-las, por aqueles que querem nos dominar.
Nesse quadro só nos resta empenhar-nos na busca de uma bandeira comum, de todo o povo, que seja viável e que o mobilize para a luta que é inevitável. Façamos isso!
Mas, hoje ficamos por aqui. É preciso tomar consciência de questões fundamentais que estão na base de todo esse processo. A primeira, de muitas outras, é sobre a principal arma que nosso inimigo usa contra nós: nossa alienação. Podemos encontrar na história um fenômeno parecido, quando os sofistas doutrinaram os mandatários de Atenas para manipular seus cidadãos através da gramática, da retórica e da oratória. Assim, os políticos obtiveram o apoio dos cidadãos para seu projeto imperial, de dominação de todo o mundo helênico. Em contraposição a essa aventura, Sócrates se insurgiu. Com seu método dialético, de análise do pensamento, ele mostrou contradições nas falácias daqueles homens que se diziam sábios. Assim, ele passou à história como o maior dos filósofos ocidentais, mas não conseguiu evitar o desastre que seus políticos produziram ao levar o mundo helênico a uma guerra fratricida, conhecida como Guerra do Peloponeso. Sócrates foi condenado à morte, por seus pensamentos, cinco anos depois do início da guerra. Os mentores desses desastrados políticos foram os sofistas, que hoje são conhecidos no Brasil como “marqueteiros”.
Por hoje fico por aqui, mas há muito mais a considerar nos próximos artigos.
Rio de Janeiro, 29/5/2017 .